Virgindade e celibato: por uma sexualidade pascal
CENCINI, Amedeo. São Paulo: Paulinas, 2012, 3a edição.
2. O dom da virgindade
Dom para todos
“A virgindade testemunhada pelo celibatário por causa do
Reino é dom para todos porque indica, de algum modo, a vocação de todos. Ou, como disse São Cipriano, a virgindade
revela ‘a integridade, a santidade e a verdade’ do ser humano. Virgindade, de
fato, não significa ausência-abstinência de relações, mas capacidade-qualidade
de relações, a partir daquela que está na origem da vida humana: a relação com
Deus” (p. 41)
“Há um espaço que apenas o amor de Deus pode preencher, ou
existe uma solidão insuprimível que nenhuma criatura poderá violar e pretender
preencher”. (p. 42)
“O jovem estudante universitário – educado, no devido tempo,
na fé – voltou a sua cidade durante as férias. O rapaz tinha aprendido alguma
coisa sobre Freud. Encontrou na praça o seu Pároco. Os tempos de catecismo
estavam distantes. Depois de alguns cumprimentos o ex-coroinha, agora ex-fiel,
com ares altivos, lança-lhe ali a grande descoberta: ‘Caro padre, não se iluda:
as pessoas que vão a sua Igreja não vão por causa da fé, mas por causa da
sublimação do impulso sexual. O senhor sabia?’
O velho Pároco não se descompõe. Freud, ainda que famoso, ele não o conhece, e
também o termo ‘sublimação’ não lhe é familiar, mas sabe alguma coisa sobre a
alma humana, dos seus desejos e das suas contradições. Com muita calma, então,
lhe rebate: ‘Quanto a mim, você sabe o que lhe digo? Que quando você bate à
porta de um bordel, pensa que está buscando a carne de uma mulher e, no fundo,
está buscando a Deus’”. (p. 43)
“(Entre o amor divino e o amor humano) não existe inveja e
ciúmes, mas, ao contrário, Deus salva o amor do homem, a tal ponto que o afeto
humano, também aquele mais feliz, conjugal ou paterno-materno ou, ainda, de amizade,
é tanto mais amor quanto mais ‘virginal’
é. Ou seja: é tanto mais benevolência humana quanto mais aprende a respeitar
aquele espaço e aquela ligação direta
com o Criador, quanto mais não violenta aquela solidão onde todo ser
humano está em relação direta e imediata (sem mediações) com o eternamente
amante, quanto mais não pretende saciar definitivamente a sede de amor do
outro, nem ser dele saciado, pois apenas Deus pode responder em plenitude à
sede humana de amor”. (p. 44)
A responsabilidade do virgem
“Eis porque na Igreja de Deus é importante a opção virginal,
não para que alguns possam tender mais rapidamente à perfeição (atenção: existe
também o egoísmo espiritual!), mas para ‘recordar’ a todos a vocação de todos,
para fazer memória do dom e do mistério que está presente no coração de todo
ser vivente, para não esquecer as possibilidades impensadas deste coração, para
que não continuem a ser ignoradas e aviltadas e, de fato, não cridas e
abortadas...”. (p. 46)
“Justamente a debilidade cultural da virgindade como vocação
universal no atual contexto social exige com insistência, para além de todo
moralismo, a nitidez da escolha e a coerência da renúncia por parte de quem a
abraçou como estilo e projeto de vida”. (p. 47)
Alternativa resoluta
“Na verdade, não há
nada mais impuro do que o silêncio do virgem diante da virgindade! E se
existe crise vocacional, ela é determinada pelo celibato ou pelo silêncio sobre
ele? Dizendo de outro modo: uma espiritualidade que não se torna pedagogia, ou
que não possa ser comunicada também aos outros e por eles compartilhada é uma
espiritualidade falsa”. (p. 50)
“Só quem respeita (a virgindade) na sua natureza de dom
recebido para o bem e a felicidade dos outros pode vivê-la serenamente e gozá-la
como uma bem-aventurança. Caso contrário, a virgindade é só penitência, penosa
de viver e de cuidar”. (p. 51)
Poesia virgem
O manto da alma
O manto da Tua alma
envolve a minha
num abraço
como nunca aparências humanas
fizeram.
Tu em mim
eu em Ti
em cada canto do mundo.
Tu vives
todas as vezes que um ser
ama.
envolve a minha
num abraço
como nunca aparências humanas
fizeram.
Tu em mim
eu em Ti
em cada canto do mundo.
Tu vives
todas as vezes que um ser
ama.
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