Salmo 62: Sede de
Deus
Vigia diante de Deus, quem rejeita as obras das
trevas (cf. 1Ts 5,5)
= 2b A minh'alma tem sede de vós,+
minha carne também vos deseja,*
como terra sedenta e sem água!
minha carne também vos deseja,*
como terra sedenta e sem água!
“A minh’alma”: é esta realidade que está
diante de meu Deus. Pequena, mas alvo do amor divino. Ela mesma não é capaz de
compreender o incompreensível, mas foi criada para estar ante a Majestade de
Amor. Ignorante de si mesma e ignorante de seu Senhor, ela foi criada para arder
de amor e nisto encontra sua bem-aventurança. “Exulte o coração dos que buscam o Senhor” (Sl 105, 3). Ai de minha
alma se se esquece ou se esquiva da verdade!
Entretanto esta alma quer e
pode crescer em conhecimento, de si e de Deus, do mundo e do seu semelhante; e a verdade que mais a atrai, vencidas as barreiras das aparências,
é Deus. Ela “tem sede
de vós”. Esta sede de eternidade e de verdade dá sentido à
vida do homem, um ser finito em suas potências, mas feito de aspirações pelo
infinito.
Não só o espírito do homem
procura um sentido, mas também sua carne, receptáculo e expressão de sua
maravilhosa interioridade. Todo homem deve confessar: “minha carne também vos deseja”. Pois esta
esplêndida criatura de Deus, o corpo humano, assumido pela
divindade na Encarnação do Filho, foi criado para ver o Amor. A carne também é capaz
de manifestá-lo e expressá-lo a tal ponto que foi querida por Deus Onipotente
na plenitude de sua Revelação. Ela não é carcereira do espírito, mas sua intérprete mais fiel, e também anseia
a beleza divina, como o manifesta, entusiasta, o justo Jó: “Eu sei que meu redentor está vivo e que no
fim se levantará acima do pó. Mesmo com a pele em pedaços e em carne viva, eu
verei a Deus. Eu mesmo o verei, e não outro; eu o verei com os meus próprios
olhos. Minhas entranhas queimam dentro de mim”. (Jó 19, 25-27)
Sua sede impressionante clama
pela misericórdia na confissão de sua impotência: “como terra sedenta e sem água”. As
rachaduras da terra árida, como gargantas abertas, são um testemunho de sua
pobreza ante o Céu "plenipresente" que pode deixar cair a água, única capaz de
fechar suas fauces. Assim é o homem ante o mistério: sedento e esperançoso.
“E como invocarei meu Deus, meu Deus e meu Senhor, se ao invocá-lo o
faria certamente dentro de mim? E que lugar há em mim para receber o meu Deus,
por onde Deus desça a mim, o Deus que fez o céu e a terra? Senhor, haverá em
mim algum espaço que te possa conter? Acaso te contêm o céu e a terra, que tu
criaste, e dentro dos quais também criaste a mim? Será, talvez, pelo fato de
nada do que existe sem Ti, que todas as coisas te contêm? E, assim, se existo,
que motivo pode haver para Te pedir que venhas a mim, já que não existiria se
em mim não habitásseis?
Ainda não estive no inferno, mas também ali estás presente, pois, se
descer ao inferno, ali estarás.
Eu nada seria, meu Deus, nada seria em absoluto se não estivesses em
mim; talvez seria melhor dizer que eu não existiria de modo algum se não
estivesse em ti, de quem, por quem e em quem existem todas as coisas? Assim é,
Senhor, assim é. Como, pois, posso chamar-te se já estou em ti, ou de onde hás
de vir a mim, ou a que parte do céu ou da terra me hei de recolher, para que
ali venha a mim o meu Deus, ele que disse: Eu encho o céu e a terra?”. (Santo
Agostinho, Confissões I, 2)
“De muitos modos, na sua história e até hoje, os homens exprimiram a sua
busca de Deus em crenças e comportamentos religiosos (orações, sacrifícios,
cultos, meditações, etc.). Apesar das ambiguidades de que podem enfermar, estas
formas de expressão são tão universais que bem podemos chamar ao homem um
ser religioso:
Deus «criou de um só homem todo o género humano, para habitar sobre a
superfície da terra, e fixou períodos determinados e os limites da sua
habitação, para que os homens procurassem a Deus e se esforçassem realmente por
O atingir e encontrar. Na verdade, Ele não está longe de cada um de nós. É
n'Ele que vivemos, nos movemos e existimos» (At 17, 26-28).
Mas esta «relação íntima e vital que une
o homem a Deus» (GS, 19) pode ser esquecida, desconhecida e até explicitamente
rejeitada pelo homem. Tais atitudes podem ter origens diversas (Cfr. GS 19-21)
a revolta contra o mal existente no mundo, a ignorância ou a indiferença
religiosas, as preocupações do mundo e das riquezas (Cfr. Mt 13, 22), o mau
exemplo dos crentes, as correntes de pensamento hostis à religião e,
finalmente, a atitude do homem pecador que, por medo, se esconde de Deus (Cfr.
Gn 3, 8-10) e foge quando Ele o chama (Cfr. Jo 1, 3)”. (Catecismo da Igreja
Católica, 28-29)
“O bem é objeto da fé enquanto verdadeiro e objeto da esperança enquanto
desejável e acessível, mas ambos dependem da caridade que tem o bem como objeto
enquanto apetecível. Ninguém crê, a não ser querendo. Ninguém deseja um bem a
não ser porque o ama. (...)
O intelecto é absolutamente anterior à vontade, porque o bem inteligido
é objeto da vontade. Mas, no operar e no mover, a vontade é anterior. (...) Por
isso, também a vontade move o próprio intelecto, enquanto é operativo, pois,
nos valemos do intelecto quando queremos. Daí que o crer é o intelecto movido
pela vontade (pois cremos em algo porque queremos). Segue-se que a caridade dá
mais forma a fé do que o inverso. (...)
Quando as coisas são mais elevadas do que o que entende, então a vontade
se eleva mais acima de onde pode chegar o entendimento. E, por isso, nas coisas
morais, que estão abaixo do homem, a virtude cognitiva informa as virtudes
apetitivas, como o faz a prudência em relação às outras virtudes morais.
Contudo, nas virtudes teologais, que são a cerca de Deus, virtude da vontade, a
saber, a caridade, informa a virtude do intelecto, a saber, a fé”. (Santo Tomás
de Aquino, Questões disputadas sobre as virtudes, q. 2, a. 3)
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